quarta-feira, 30 de maio de 2012

A flechada de Tashka


Caro Ninawa e demais companheiros,

Deixe-me tomar aqui meu rapé, para conseguir uma inspiração para soprar pra cima e esclarecer ao companheiro Niinawa e seus apoiadores de que eles erraram o alvo ao me atacar gratuitamente. Em vez de guardar rancor, desejo que todas suas reivindicações sejam prontamente atendidas.

Nesses últimos meses, tenho acompanhado toda movimentação em torno das reivindicações que estão sendo feitas em prol da saúde indígena, da demarcação das terras indígenas, projetos de REDD, dentre outras. Todas justas, devo dizer. Meu desejo, repito, é que todas as reivindicações sejam prontamente atendidas.

É muito feio a gente ficar trocando farpas através dos meios de comunicação dos brancos, mas é preciso repor a verdade.

Mesmo cuidando de meus compromissos com a Associação Sociocultural Yawanawá (ASCY) estou sempre atento a tudo que está ligado à questão indígena em nosso Estado. Meu posicionamento tem sido sempre de legitimar qualquer manifestação em defesa dos interesses de nossos povos indígenas. Porque eu acredito no movimento indígena. Acredito num movimento autêntico, onde nossas lideranças tenham espaço para reivindicar seus direitos e exigir dos órgãos públicos o cumprimento das políticas voltadas ao povo indígena. Os nossos direitos devem, ou pelo menos deveriam, estar acima de picuinhas, guerrinhas que são muito mais de brancos que de índios.

Lamento muito quando reivindicações do movimento, apesar de boas, são manipuladas por organizações indigenistas que tentam tirar proveito político da penúria e desgraça em que se encontra o movimento indígena. É triste quando o povo indígena serve de massa de manobra para atender interesses de terceiros. Não podemos jamais permitir que nosso povo e nossas organizações sirvam de objeto de manobra.

Confesso, com muita dor no coração, que tenho visto muitas notícias distorcidas veiculadas para criar fatos. Não precisamos desses artifícios para justificar uma luta que por si já é legitima. Assim também tenho visto inúmeras inverdades sendo ditas, como as de que as lideranças indígenas estão sendo induzidas a aceitarem projetos de carbono em seus territórios, que lideranças estão sendo compradas e manipuladas. Finalmente, hoje você se superou, meu caro Ninawa, ao afirmar para o jornal A Tribuna, inverdades, mentiras. Porque é mentira sua dizer que estou recebendo pagamentos para apoiar os projetos de carbono do governo.

Niinawa ravïwe. Mi vesu anu ravï yamai? Txanihi ravïti. Askayamawe txai, mi vakehu maki. Nawahu uïtsamapai mï teikisa ari mari tsãi putai, askayamawe. Nü hunikuishü, nu shanãihushü nukë tsãi westisi. Mï nawahãu tsãi putaisi, ma mi tsani xarawa.

Como de praxe, minha participação tem sido sempre ferrenha em defesa de nossos direitos. Nunca recebi nada por isto, quem me conhece sabe disto. Você sabe disto. Não vendo minha alma, minha dignidade e integridade. Sempre tive opinião e ponto de vista próprio, daquilo que considero correto e coerente. Quando acredito vou até as últimas conseqüências. Não estou à venda. Falo por mim. Você fala por você.

Não preciso acampar em prédios públicos para fazer minha voz chegar aos quatros cantos da terra. De onde estou faço minha guerra e a minha defesa, daqui toco meu tambor e chacoalho meu tacapi. Para mim, a defesa dos direitos do meu povo, dos meus parentes, está acima de vaidades pessoais.

Sou Yawanawá, povo da queixada. Sou guerreiro. Mas, minha guerra tem um único foco, um único objetivo: garantir que os direitos do meu povo, dos meus parentes, sejam assegurados, sejam mantidos, conquistados. Disso jamais abrirei mão. Por isso não aceito mentiras jogadas ao sabor do vento por quem deveria estar na mesma linha de frente que eu e tantos outros parentes que têm dedicado sua vida a esta causa. Sou de luta. Nunca fugi de uma boa luta. Aliás, dou um boi para entrar numa briga e dou uma boiada para não sair mais dela. Não tenho rabo preso com ninguém. Sempre tenho dito que a riqueza que Deus me deu nesta terra é ter nascido no meio de um povo tão lindo como o Yawanawá e os inúmeros amigos que tenho. Minha relação com o meu povo e com os demais povos indígenas nunca foi de trabalho, sempre foi uma relação de compromisso de vida. E, pelo meu povo, vou às últimas conseqüências. Só por isso estou aqui usando este espaço para reparar as inverdades que você disse.

Quem não deve, não teme. Por isso, sinto o ar da brisa tocar na minha face com o ar de liberdade de falar e opinar sobre qualquer coisa na hora que achar necessário. Tenho endereço fixo, Niinawa, na aldeia Mutum. Tenho um povo e um trabalho sério que desenvolvo há 12 anos, o projeto de desenvolvimento socioeconômico Yawanawá. Subo o Rio Gregório parando nas aldeias, reunindo com meu povo, discutindo nossos problemas e tentando encontrar uma solução para a coletividade. Aqui em Rio Branco , você me encontra na minha casa ou mesmo nas ruas da cidade, andando de sandálias havaianas, saudando um amigo aqui e outro acolá. Não devo nada a ninguém e nem ninguém me deve nada. Assim desfruto a cada minuto desses lugares como se o amanhã fosse hoje. Livre. Sem amarras. Sem medo. Desfruto da confiança de muita gente que me conhece bem pelo que sou e não pelo que falam de mim.

Te convido, Ninawa, a visitar o Rio Gregório e suas aldeias. Lá é a minha base, minha casa. Literalmente, minha aldeia, como gostam de dizer os brancos. Não faço só política. Faço trabalho também, pois nem só de política o homem viverá. Os bons exemplos começam dentro da nossa casa.

O Acre precisa de um movimento indígena legítimo, que venha das bases e não de um movimento surgido nos centros urbanos. O meu inimigo, txai, é outro. O inimigo é o lobo que anda ao seu lado disfarçado de ovelha. O mesmo que no passado tentou desmoralizar importantes lideranças, como Ailton Krenak e Álvaro Tucano, e hoje tenta fazer o mesmo com Almir Surui, dentre outros. Usando sempre as mesmas táticas de colocar as lideranças indígenas para se digladiarem, enquanto ficam assistindo o show lambendo os beiços, como verdadeiros chacais.

Te convido também, Niinawa, a lutar no nosso campo de batalha. Ainda há tempo. Como disse, não somos inimigos. Somos parentes. Saia do anonimato e da trincheira, meu amigo, venha pro abraço e vamos somar juntos na construção de um verdadeiro movimento indígena.

Um abraço,
Tashka Yawanawá

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