quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Um Tarauacaense nas mãos da ditadura

Adson Leite e Paulo Coutinho

Golpe militar que infelicitou o povo Brasileiro por mais de duas décadas teve um personagem filho de Tarauacá que sofreu barbaridades nos porões da ditadura. Chama-se Adson de Souza Leite, 66 anos de idade nascido em Tarauacá-Acre, filho de Maria Leite e José Leite.

Adson foi indenizado pelo estado brasileiro e promovido a subtenente da marinha. No inicio do ano fiz uma viagem no Rio Murú com ele e Paulo Coutinho tenente fuzileiro naval também aposentado da marinha do Brasil. Coutinho também foi cassado preso e depois obrigado a viver na clandestinidade e ingressar na luta armada. Na viagem ao rio que durou 10 dias, entrevistei Adson, é um relato de arrepiar qualquer democrata. Leia a entrevista.Adson foi indenizado pelo estado brasileiro e promovido a subtenente da marinha. No inicio do ano fiz uma viagem no Rio Murú com ele e Paulo Coutinho tenente fuzileiro naval também aposentado da marinha do Brasil. Coutinho também foi cassado preso e depois obrigado a viver na clandestinidade e ingressar na luta armada. Na viagem ao rio que durou 10 dias, entrevistei Adson, é um relato de arrepiar qualquer democrata. Leia a entrevista. RT-Como você foi para o Rio de janeiro e ingressou na marinha?

Aos 17 anos fiz um curso pelo correio para tenente da aeronáutica. Fui chamado para me apresentar em Guaratinguetá São Paulo, na época tudo era difícil, quando consegui chegar a São Paulo não deu mais tempo, as vagas já haviam sido preenchidas, foi ai que decidi ir para o Rio de janeiro, lá morava um irmão meu que estudava medicina. Trabalhei um tempo em uma eletrônica concertando rádios e depois fiz um curso de sargento da marinha, consegui ingressar como soldado fuzileiro naval. Com o golpe de 64 fui convocado para reprimir uma assembléia dos marinheiros que estavam reunidos no Sindicato dos metalúrgicos. Eles estavam contra o golpe e defendiam a permanência do presidente João Goulart. Quando chegamos ao local toda a tropa decidiu depor as armas e aderir o movimento pela democracia. Em função disso, fui preso e barbaramente torturado, oito meses depois, consegui ser liberado através de hábeas corpus e fugi para o acre.

RT-E ai, que aconteceu?

Vim para Tarauacá trabalhar na prefeitura com o prefeito Américo Figueiredo do MDB, em 1966 fui localizado pelo o regime militar através de denúncias de representantes da arena no município. Ameaçado de prisão, fugi para o seringal bom futuro no rio murú onde trabalhei como comboieiro. Considerado foragido em 1965 fui condenado à revelia a cinco anos e seis meses de prisão. Fiquei três anos no seringal sem andar na cidade. Em 1968, entrei na campanha de prefeito do candidato do MDB, mais uma vez fui denunciado pelos os representantes do regime militar no município (arena). E mais uma tive que fugir para o seringal. No mesmo ano fui intimado pelo o juiz da comarca de Tarauacá a comparecer para prestar esclarecimentos sobre a denúncia. O juiz considerou que eu não havia necessidade da minha prisão. Pois estava trabalhando e não causava risco à sociedade, mais uma vez tive que voltar para o seringal. Em 1970 decidi correr um grande risco, candidatando a vereador no município pelo o MDB, na mesma semana da convenção, os representantes da arena no município denunciaram para a marinha no Rio de Janeiro. Em 06 de novembro do mesmo ano o exercito de Tarauacá recebeu ordem do Rio de Janeiro para efetuar minha prisão. No dia 14 do mesmo mês chegou a Tarauacá um avião da FAB com trinta militares do exercito para cumprir ordem de prisão. Os militares armados de fuzis sitiaram a cidade, entravam nas casas e expulsavam todos os moradores ordenando que todos ficassem no meio da rua, dizendo que estavam procurando um terrorista muito perigoso. Na ocasião eu estava fazendo campanha no seringal Novo Destino e recebi o aviso que o exército estava rodando toda a cidade a minha procura. Como eu não tinha mais saída, decidi me entregar.

RT-Como Você reagiu à ordem de prisão?

Houve uma grande tensão, os militares estavam todos com os fuzis apontados na minha direção. A tropa ameaçava atirar, de mãos levantadas me entreguei. Em meio a confusão, os militares agrediram meu irmão e minha mãe que tentavam impedir minha prisão. Depois de preso fui levado para o quartel da PM, fiquei preso em uma cela sobre forte vigilância policial. No dia 15 de novembro de 1970, fui colocado no avião da FAB e levado para Cruzeiro do Sul, dentro do Avião os militares iniciaram uma sessão de tortura. Quando cheguei ao aeroporto, 10 carros do exército me aguardavam. Imediatamente fui amarado em um jipe aberto e assim fui levado para o quartel e colocado dentro de um banheiro fedido onde ali permaneci por seis meses e dez dias sem direito de tomar banho e escovar os dentes, recebendo só uma refeição por dia. Cumprindo seis meses de prisão em Cruzeiro do Sul fui transferido para Manaus, no quartel amazonense fui colocado num quarto sem sanitário com 20 centímetros de água dificultando minha dormida. Após oito dias de prisão foram ao quartel três dos meus irmãos na tentativa de me visitar. Mas, foram impedidos pelos militares sendo agredidos brutalmente. Passando-se esse período de tortura de fome e humilhação fiquei todo inchado e irreconhecível. Dias depois os militarem aceitaram a visita de apenas um de meus irmãos e permitiram a entrada de um rádio na cela. Com o radio eu não estava mais tão só, ficava o tempo todo ouvindo as noticias.

RT- E depois?

Depois desse período de sofrimento em Manaus fui colocado em um carro e sobre forte esquema de segurança fui transferido para Belém. No aeroporto de Belém, fui brutalmente torturado e levado para o corpo de fuzileiro naval da marinha. Da prisão em Tarauacá até Belém já se passara quase um ano de tortura e sofrimento. Na prisão ficava sempre de cueca e apenas uma calça e uma blusa para as viagens. Fiquei três meses em Belém e fui transferido para Brasília. Na capital do país fiquei três dias preso no quartel e fui novamente transferido para o Rio de Janeiro, de lá, fui levado para a ilha das cobras. Fiquei apenas dezoito dias e depois levado para o presídio da policia civil Frei Caneca, onde fiquei mais oito dias preso em uma cela com 16 prisioneiros.

Depois do Frei Caneca, fui levado para o presídio da Ilha grande, onde fiquei preso um ano e seis meses com vários presos políticos, em maio 1972, sai da prisão, encontrei com amigo que ajudou comprar minha passagem e voltei imediatamente para Tarauacá.

RT-Estava livre. Chegou o fim de um longo período de sofrimento.

Não! Quando cheguei a Tarauacá, o prefeito que era da Arena, foi até o quartel do exercito e ao juiz pedir para me expulsar da cidade. Argumentando de que eu era um terrorista e colocava em risco a segurança da população. O juiz atendendo ao pedido decidiu me deportar. Quando recebi a intimação me desesperei, ficava pensando que ia começar tudo de novo. Decidi ir até o fórum, chegando lá, o juiz confirmou a decisão. Desesperado e lembrando de tudo que já sofrido, disse ao juiz que não aceitava. Sai do fórum e me sentei no meio da rua. Sentado no chão, eu dizia para o Juiz e todas as pessoas que passavam que só saia de Tarauacá morto. O juiz mandou chamar o exercito para me levar a força, sendo interrogado pelo o comandante, o capitão entendeu que não havia necessidade de me deportá-lo da cidade, insatisfeito o prefeito colocou dois policiais para me seguir diariamente, era uma tentativa de criar medo na população.

Dias depois, fui novamente intimado pelo o comandante. Quando cheguei à sala, o capitão determinou que eu fosse trabalhar como serrador para construir o quartel, essa era a condição para não ser deportado, ficando em liberdade e trabalhando para o Exercito. Aceite a imposição para não ser preso mais uma vez. Depois de trabalhar vários meses finalmente fui liberado.

RT - Chegou o fim da escuridão...

É... Depois de tudo, decidi voltar para o seringal bom futuro, arrendei outros seringais e fui trabalhar como seringalista.

Nenhum comentário:

Postar um comentário